Nos últimos dias as redes sociais só falam de um assunto: a PL 1904/2024. O Projeto de Lei proposto pelo deputado Sóstenes Cavalcante (PL/RJ) quer mudar as regras já pacificadas pela Constituição Federal sobre os casos em que o aborto é considerado legal como quando a pessoa que gesta corre risco de vida ou a gestação é fruto de casos de estupro.
A mobilização digital sobre o tema mobilizou deputados contrários, famosos e fandons de artistas pop para levar conhecimento à população sobre o que poderia mudar na legislação. Em votação que durou 24 segundos, o plenário da Câmara dos Deputados decidiu que o projeto deveria tramitar com urgência na casa, o que dispensa que ele passe pelas comissões necessárias e seja debatido à exaustão.
A mobilização social negativa sobre o tema, em telejornais e nas redes sociais, fez com que o presidente da Câmara, o deputado Arthur Lira (PP/AL), recuasse com a votação do mérito do projeto, ou seja, questionar aos parlamentares se legislação vigente deveria ser alterada ou não.
Em conversa com a nossa redação, Daniela Mercury relatou que acredita que o texto não prosseguirá. “Não vai ser aprovado, não vai chegar a virar lei. Mas isso mostra a cabeça da Câmara, com o que ela está preocupada em vez da gente avançar em direitos. Eles estão preocupados em votar algo que é afrontoso contra as mulheres brasileiras contra as crianças brasileiras contra direitos já adquiridos. E isso fere a nossa alma”, afirmou.
A atriz Juliana Paiva se manifestou sobre a liberdade da mulher: “Eu acredito que a mulher tem que ser livre. Nenhuma mulher escolhe fazer aborto de forma feliz e tranquila; algo aconteceu que a levou a tomar essa decisão difícil. Todas as mulheres que conheço e que já passaram por isso consideram essa experiência uma parte traumática de suas vidas. Portanto, acho que a mulher deve ser respeitada, principalmente em casos de desrespeito relacionados a estupro. Estupro de menor é algo extremamente grave, e uma criança não é mãe. Então, acredito que, cada vez mais, quando falamos de liberdade, devemos ter voz em todos os sentidos. Estamos aqui para sermos felizes da maneira que pudermos, e acho que cabe à pessoa que viveu aquela situação decidir o que é melhor para ela”.
Ingrid Guimarães também demonstrou sua insatisfação: “Eu sou completamente contra isso. É uma das coisas que mais têm me mobilizado nos últimos tempos. Não é possível que a pena de uma mulher que foi estuprada por violência doméstica seja maior do que a do estuprador. Isso mostra todo o ódio que existe contra a mulher neste país. Isso é um absurdo, e eu sou completamente contra”.
Danielle Winits declarou: “Olha, acho que essa é uma questão tão óbvia, né? E não só as mulheres, mas todos deveriam enxergar isso de forma global. Estamos falando do Brasil, mas essa questão do aborto é mundial. Eu estou do lado das mulheres e sempre estarei. Acho que existe uma hipocrisia muito grande no mundo hoje em dia, e é isso. Não dá para ser hipócrita. Precisamos estar sempre ao lado das mulheres.
Alinne Moraes: “A gente não tem nem nas escolas, né? A gente fala e estuda com as crianças e os adolescentes, mas tudo é muito tardio. Então, eles não têm como se proteger nem como se informar adequadamente. Esse é um assunto muito delicado e importante, que precisa ser cada vez mais discutido. A internet nos trouxe essa possibilidade de entender melhor o que está acontecendo, mas ainda é complicado. Uma vírgula pode mudar tudo. Por isso, eu prefiro me posicionar em outros contextos, não assim, com meu filho aqui. Acho que não é o caso. É um assunto muito delicado”.
Juliana Didone: “Eu já me posicionei, e é absolutamente um retrocesso quererem decidir sobre nossos corpos. Não podemos deixar isso passar, não tem o menor cabimento. É uma violência nojenta, e sou radicalmente contra. Precisamos ficar de olho, pois este ano são as eleições. Precisamos pensar muito bem em quem são os senadores que estamos votando. Eu vou começar a me posicionar mais, as mulheres precisam se unir”.
O que é aborto legal
Segundo o Código Penal Brasileiro, a prática de aborto é crime no país de forma geral, mas está coberto pela Lei em três situações. Estas situações são chamadas popularmente de aborto legal. Não há um prazo legal de semanas para que o procedimento seja realizado.
• Quando há anencefalia fetal. Ou seja, quando uma má formação faz com que o cérebro do feto não se desenvolva e reduza drasticamente suas chances de vida;
• Quando a gestação, por qualquer motivo, coloca em risco a vida da pessoa que gesta;
• Quando a gestação é resultado de um crime de estupro.
Nos dois primeiros casos, anencefalia e risco de vida da gestante, o procedimento só é realizado após laudos médicos que comprovem as situações. Exames complementares podem ser requeridos pelas equipes que assistirem essas pessoas que gestam e seu direito à retirada do feto deve ser garantido pela Lei.
Para a interrupção da gravidez em decorrência de estupro, segundo a Lei, a pessoa que gesta não precisa apresentar nenhum laudo médico, boletim de ocorrência ou outra notificação oficial do crime. O relato da vítima deve bastar à equipe médica. Infelizmente o relato não é facilmente aceito por equipes médicas e outras providências precisam ser tomadas para que as vítimas tenham seu direto garantido.
Vale lembrar que o crime de estupro não é praticado apenas quando há agressão, ele é tipificado basicamente quando não há consentimento das partes.
O que pede o PL 1904/2024
O Projeto de Lei proposto por Sóstenes, que é pastor evangélico, pede que o Código Penal seja alterado e que seja aplicada a pena de homicídio para a interrupção de gestações acima de 22 semanas.
• A nova tipificação irá abranger pessoas que provoquem o aborto em si ou que outra pessoa o faça, inclusive médicos. A pena passa de 1 a 3 anos para 6 a 20 anos de prisão;
• Que tenha um aborto provocado por terceiros com ou sem seu consentimento. A pena para quem realizar o procedimento com consentimento da pessoa que gesta passa de 1 a 4 anos para 6 a 20 anos, e sem o consentimento de 3 a 10 anos;
• O texto também muda o entendimento do que é o aborto legal. Ele afirma que o procedimento só poderá ser realizado até a 22ª semana, mesmo em casos de estupro e risco de vida para a pessoa gestante.
Parte da polêmica se deu porque, caso uma pessoa que gesta seja violentada e queira interromper a gravidez após as 22 semanas, sua pena pode passar dos 20 anos de reclusão. Já a do estuprador, quando condenado, chegaria apenas a 15. A vítima seria mais penalizada do que o agressor.
Fonte Revista Quem