O último final de semana de maio é, com certeza, o mais importante, emocionante, perigoso e charmoso do automobilismo esportivo mundial, pois são realizadas duas das mais marcantes provas do calendário, o GP de Mônaco e a 500 Milhas de Indianápolis.
Isso me faz sentir que estamos vivendo uma entre safra do automobilismo esportivo brasileiro, sem nenhum piloto na Fórmula 1 para vencer em Monte Carlo e sem nenhum com chances de conquistar a 500 Milhas, a Fórmula E ou Fórmula 2.
Para um país que se acostumou a ver as vitórias de Senna, nas ruas do Principado, de Émerson, Hélio Castro Neves, Gil de Ferran e Tony Kanaan nas 500 Milhas, esse momento não é dos mais empolgantes.
A verdade é que a vida é de ciclos, muito dinâmica e que, para não ficarmos para trás, precisamos estar sempre buscando evoluir e melhorar.
O que ocorre hoje no automobilismo esportivo nacional, já aconteceu e acontece com outros esportes nos quais a liderança mundial ou até uma supremacia é alternada por atletas de diferentes nações.
Mas, como disse antes, nos acostumamos muito mal, pois de 1972 até cinco ou dez anos atrás, conquistamos 8 títulos na Fórmula 1 (fora vários vice-campeonatos) e 8 vitórias na 500 Milhas, além dos títulos na Fórmula E, com Lucas Di Grassi e Nelson Piquet, de várias vitórias marcantes em outras categorias até o recente título de Felipe Drugovich na Fórmula 2.
O mais importante e positivo é que não nos faltam talentos, continuamos a ver surgirem grandes e bons pilotos. Mas o caminho até às categorias do topo acabou se perdendo ou tornando-se muito mais difícil. Também sei que talento somente não é suficiente. É preciso um conjunto de atributos, inclusive forte apoio financeiro. Mas, de certa forma, sempre foi assim.
O que me enche de esperança é o trabalho que vem sendo realizado pela CBA, já há alguns anos, para fortalecimento do nosso automobilismo. Recentemente disse e reafirmo que o momento atual me lembra muito o final dos anos de 1960 e início de 1970, época de ouro do esporte, quando a efervescência e empolgação eram tamanhas que literalmente moviam montanhas.
Quem não viveu pode achar que naquela época era mais fácil e barato chegar às principais categorias. Entendo que era diferente. Os requisitos, desafios e obstáculos eram outros, mas devagar e com um trabalho persistente e contínuo abriu-se caminho para muitos pilotos chegarem à Fórmula 1. Oportunidades que hoje parecem não se abrir tão fácil.
Quero voltar a ouvir e viver histórias como as de Camillo Christófaro que, ainda nos anos de 1950, como um profeta, disse que um brasileiro poderia vencer a 500 Milhas de Indianápolis. E militantes do automobilismo acharam que ele estava louco com o comentário feito num programa de televisão.
Anos mais tarde, quando Emerson Fittipaldi descobriu o caminho para chegar às categorias principais, conquistando os dois primeiros títulos mundiais na Fórmula 1 e, depois, ingressou no automobilismo norte-americano e venceu as 500 Milhas e o campeonato da Fórmula Indy, confirmou a profecia de Camillo e desmentiu o que consideraram um entusiasmo exagerado.
Em seguida, Nelson Piquet e Ayrton Senna transformando o automobilismo internacional em verdadeiros shows de habilidade e criatividade em espetáculos empolgantes nas pistas mundiais e outros jovens brasileiros como protagonistas, disputando a liderança e o título da Fórmula 3 europeia e britânica.
Quero que circuitos ao redor do mundo sejam “rebatizados” como foi Silvertone na época de Ayrton Senna na Fórmula 3 que, de tanto vencer, passou a ser chamado de “Silvastone”.
São tantas conquistas, tantas boas lembranças, tantos desafios vencidos que acho impossível que, em um curto espaço de tempo, não voltemos a liderar o automobilismo mundial e ver nossos pilotos conquistando vitórias e disputando o título das principais categorias.
Assim como no futebol, a cada Copa do Mundo, sonhamos com o hexa, aguardo ansioso pela nona vitória na 500 Milhas, pela sétima em Mônaco e pelo nono título da Fórmula 1. Se nesse interim vierem vitórias e títulos na Fórmula E, Fórmula 2, na Indy, no WEC, e porque não na MotoGP, eu não vou reclamar.
O trabalho realizado pela CBA transformou o automobilismo em um empreendimento de investimento com retorno garantido. Jamais as corridas conquistaram o prestígio construído nos últimos anos, reconhecido pela FIA – Federação Internacional do Automobilismo, com a conquista do Troféu José Abed 2023, como a entidade que melhor trabalho desenvolveu em todo o mundo.
As recentes ações, programas e iniciativas da CBA vão, com certeza, ajudar a reencontrarmos esse caminho. A criação de uma categoria nacional de monopostos idêntica às europeias, o incentivo forte à participação feminina nas competições em todos os níveis e a cultura de construir uma base nacional sólida e reconhecida internacionalmente são fundamentais e a mola propulsora para voltarmos ao topo.
Muito Além de Rodas e Motores