No “Encontro com os Escritores” que marcou o lançamento do livro “O mercado da morte: conexões e realidades”, realizado no último dia 26 na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, o autor Wálter Fanganiello Maierovitch revelou ao público que a obra se trata da terceira parte de uma trilogia que aborda a criminalidade transnacional, uma criminalidade sem fronteiras que põe em xeque o Direito Internacional, que regula por meio do Direito Internacional Público as relações entre países e instituições internacionais multilaterais.

Se analisada sob um olhar panorâmico, tal trilogia lançada pela Editora Unesp, iniciada em 2010 com “Novas Tendências da Criminalidade Transnacional Mafiosa” e seguida pelo premiado “Máfia, Poder e Antimáfia”, pode ser considerada uma leitura antecipada dos sintomas que hoje vêm à tona e trazem a reboque uma crise aguda que desafia a promoção da paz, a cooperação comercial entre as nações e, em última análise, a ordem global.
“Hoje há 49 guerras em curso (no mundo) e uma propaganda de guerra muito intensa”, afirma Wálter Maierovitch. “De todo este cenário, sai uma primeira vítima, que é o Direito Internacional Público”, diz o autor, que fez carreira na magistratura de São Paulo como juiz da Vara de Execuções Penais da capital e desembargador do Tribunal de Justiça.
Amigo de longa data de Maierovitch, o ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Sidnei Beneti foi convidado pelo autor a fazer parte do debate, mediado pelo jornalista Milton Yung, e fez uma análise técnica sobre a fragilidade de instrumentos existentes para se punir a criminalidade transnacional e desmontar o chamado mercado da morte.
“O Direito Internacional não age como o Direito nacional, que tem o poder de, por intermédio da decisão judicial, fazer com que as pessoas cumpram aquilo que foi determinado pela atividade jurisdicional”, diz Sidnei Beneti. “Não há um poder internacional único que execute a sanção internacional, de forma que esta é realmente mais débil e repousa, em grande parte, na moralidade internacional e na capacidade dos Estados de, individualmente, aderirem a esta sanção”, afirma o ex-ministro do STJ.
Wálter Maierovitch citou a indústria bélica e o mercado de exportação de armas, a que chamou de “exportadores de violência”, como forças que agem contra avanços de convenções e tratados internacionais como o Estatuto de Roma, que estabeleceu o Tribunal Penal Internacional (TPI), tribunal criminal sediado em Haia que pode abrir processos contra indivíduos por crimes de guerra ou crimes contra a humanidade. Muitos países não subscreveram ou não ratificaram o Estatuto de Roma, o que significa que não reconhecem a jurisdição do TPI ou não são obrigados a cooperar com suas decisões.
“Veja que dirigentes importantes de países do mundo estão com dificuldades de locomoção para outros países, consequências dos julgamentos do Tribunal Penal Internacional, com toda a fragilidade que tem este tribunal por ser um tribunal internacional não dotado de sanção própria”, pondera Sidnei Beneti, lembrando que os magistrados hoje se comunicam mais e conhecem mais os problemas nacionais recíprocos.
Para o autor de “O mercado da morte: conexões e realidades”, as manifestações recentes que encheram as ruas de capitais brasileiras contra a chamada “PEC da Blindagem”, que dificultaria a aplicação de penas a parlamentares e chegou a ser aprovada pela Câmara dos Deputados, são exemplos de mobilizações da sociedade civil que podem fazer a diferença em prol de uma mudança cultural que torne o mundo menos violento.
“Sempre (está) na mão da sociedade civil reagir, exigir mudança cultural”, diz Maierovitch, interpretando o fechamento da trilogia como um chamado à cultura de paz. “É um caminho que a gente tem que construir, tem que buscar com a sociedade civil uma cultura de paz. E vale para todos os setores, não só a violência do Estado”.
