Alberto Vianna, 69 anos, usa o Facebook todos os dias, sobretudo para acompanhar notícias e participar de grupos de conversa.

A rede também é um meio de manter os laços com familiares e amigos distantes, além de funcionar como um ambiente de troca de informações e experiências.
— Recebo notificações, isso sempre me chama para o aplicativo. Gosto de comentar nos grupos, e já reencontrei vários amigos com quem tinha perdido contato — relata.
A rotina digital de Vianna é prova de que, mesmo com a ascensão de redes sociais como Instagram e TikTok, o Facebook segue reinando entre os usuários mais velhos.
Na plataforma, 12,7% dos usuários ativos têm mais de 55 anos — a maior proporção entre as grandes redes sociais. Os dados são de empresas especializadas em análise de comportamento digital, como DataReportal, Statista e SproutSocial.
Na comparação, o Instagram soma 6,1% de usuários com mais de 55 anos. O TikTok, 5,8%. O X, antigo Twitter, chega a 7,3% (50 anos ou mais), enquanto o Pinterest, com boa adesão entre mulheres mais velhas, alcança 13% (somando 8,5% na faixa 55-64 e 4,5% entre 65+), mas com proposta bem mais nichada. Já o LinkedIn reúne apenas 3,8% desse público, com foco majoritariamente profissional.

A usabilidade do Facebook ajuda
No Facebook, esse público encontra uma combinação rara: facilidade de uso, familiaridade, conteúdo relevante e, sobretudo, vínculos sociais. Segundo especialistas, a rede criada em 2004 continua sendo, para muitos da terceira idade, não só a porta de entrada para o mundo digital, mas também o ambiente onde se sentem mais confortáveis para permanecer.
— O Facebook se consolidou como um espaço onde o público 60+ consegue se localizar melhor. Ele reúne imagem, notícia, mensagem, tudo o que esse grupo busca. As conexões estão ali: pessoas, amigos, publicações que interessam. O Facebook nunca sumiu — analisa André Fagundes Pase, doutor em Comunicação e professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Para Bruno Riether, especialista em marketing e inteligência artificial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), essa permanência tem forte relação com a maneira como os idosos acessam a internet: de forma mais intencional, menos impulsiva e buscando vínculos reais.
— O público 60+ não navega por impulso. Eles entram com propósito, comentam nas fotos da família, querem rever amigos e valorizam interações mais significativas. Não estão ali pra viralizar, estão ali pra se conectar e matar a saudade — explica.
Familiaridade, hábito e segurança cognitiva
A longevidade da plataforma e a ausência de mudanças bruscas ajudam a explicar por que muitos continuam fiéis à rede. Para quem começou a usar a internet tardiamente, o Facebook oferece um ambiente mais amigável e menos caótico do que outras redes.
— É uma combinação de hábito, usabilidade e identificação com o conteúdo. O Facebook é mais fácil de usar para quem não nasceu na era digital. A sensação de familiaridade influencia muito — afirma Pase.
Riether acrescenta ainda que o layout mais estável e o texto como linguagem dominante são fatores de segurança cognitiva.
— O layout é mais tradicional, menos carregado de estímulos visuais e movimentos. Isso gera segurança cognitiva. A linguagem, com mais texto e menos códigos visuais, é mais acessível pra quem aprendeu a usar a internet depois dos 60 — detalha.
A familiaridade, nesse caso, não é só um conforto, é também o que garante autonomia.
— Quando uma pessoa de 60+ sente que domina uma plataforma, ela dificilmente vai trocar por outra onde precise reaprender tudo do zero — reforça o especialista.
Reencontros, grupos e rotina
Divair Macedo Costa, 64 anos, prefere usar o Facebook para assistir a vídeos. Ele entrou na rede porque “todo mundo estava usando” e acabou se acostumando.
Costa destaca também que a rede segue sendo seu principal canal de diversão e rotina digital:
— Não é vital pra mim, mas é algo que uso para me divertir. Se acabasse, eu sentiria falta por um tempo, porque me acostumei a usar todos os dias.
Segurança percebida, mas nem sempre garantida
A percepção de segurança é um dos fatores que ajuda a explicar a permanência dos idosos no Facebook. A familiaridade com a plataforma reduz o receio de cometer erros e transmite uma sensação de controle.
No entanto, isso não significa que o ambiente seja, de fato, mais protegido — especialmente quando se trata de golpes.
— É um ambiente mais familiar, e isso transmite segurança. Mas o público 60+ é bombardeado com tentativas de golpe, especialmente em grupos de compra e venda. É preciso atenção — alerta Pase.
Riether ressalta que, mesmo com os riscos, o Facebook ainda é visto como um “lugar conhecido”, o que acaba passando uma ideia de proteção.
— Mesmo que isso nem sempre se confirme na prática, o Facebook ainda oferece um tipo de conforto emocional. Redes como TikTok e Instagram exigem exposição visual, performance. Já no Facebook, o conteúdo pode ser mais discreto, e a participação não exige tanta exibição — afirma.
Na realidade, muitos idosos já enfrentaram situações de risco. Alberto Vianna, por exemplo, quase caiu em um golpe ao tentar comprar uma máquina de lavar anunciada na rede. Já Costa chegou a perder dinheiro em uma compra que nunca foi entregue.
Apesar dos episódios, ambos dizem se sentir relativamente confiantes ao navegar pelo Facebook, justamente por conhecerem melhor a plataforma e saberem como reagir diante de uma situação suspeita.
— Depois que vi que uma notícia era mentirosa, alertei os outros. Acho importante verificar todas as informações antes de compartilhar algo — conta Vianna.
Espaço de pertencimento
Para além do consumo e da comunicação, o Facebook também se firmou como um ambiente de pertencimento. Os grupos (de bairro, saúde, religião, receitas, lazer) oferecem um espaço de troca e com vínculo emocional.
— Esses grupos são uma conexão com a própria comunidade. É por ali que o idoso pode conhecer melhor o seu entorno — afirma Pase.
— Os grupos são o diferencial da rede para o público 60+. Eles encontram ali trocas reais e um espaço para compartilhar experiências. Grupos de bairro, espiritualidade, até de viagens. É onde eles se sentem parte — completa Riether.
Segundo ele, o comportamento dos idosos no Facebook também vem mudando: muitos já entendem melhor os limites do público e do privado, usam filtros de informação e até empreendem, mesmo que de forma despretensiosa.
— Muitos já vendem produtos, divulgam causas e usam a rede de forma profissional sem perceber. É uma evolução silenciosa, mas muito expressiva — emenda.
Resistência às novas redes
Para quem está inserido no Facebook há anos, a ideia de migrar para outra rede pode não parecer atrativa. Conforme os especialistas, não se trata apenas de aprender a usar uma nova ferramenta, mas de mudar todo um ciclo social.
— Tem o medo de errar, a dificuldade com a linguagem visual das novas redes e também o fato de que o ciclo social deles está no Facebook. Migrar exige mais do que só técnica, exige disposição emocional e social — avalia Riether.
Enquanto novas plataformas surgem com apelo visual ou dinâmicas aceleradas, o Facebook segue firme. Não necessariamente por ser o mais moderno, mas por ser o mais confiável. E isso, para quem tem 60+, vale mais do que qualquer nova tendência.
— O Facebook tem esse poder: reconectar com o passado, manter contato com o presente e, para alguns, até gerar novos negócios — conclui Pase.
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